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“Respeitai as autoridades porque elas são constituídas por Deus”, diz pastor

Religiosos se apoiavam nas estruturas para permanecerem neutras durante o regime.

Por Wagner Luan

Diversas igrejas evangélicas tradicionais se mantiveram neutras durante a Ditadura. Batistas, adventistas, Brasil para Cristo e outras passaram a Ditadura como se nada tivesse acontecido.

Muitos podem pensar que as igrejas estavam alheias a tudo que estava acontecendo, mas, na verdade elas seguiam uma orientação dos líderes. Muitos acreditavam que os militares representavam aquilo que eles pregavam nos púlpitos.


O pastor batista Cleverson Pereira do Valle nasceu em 1970 e viveu a infância e parte da juventude no regime militar. Ele morava em Mairiporã, na Grande São Paulo. Frequentava uma igreja na capital paulista. Segundo ele, os valores pregados na igreja eram seguidos pelos militares. “Eu era pequeno e lembro que as coisas eram mais respeitadas, hoje você anda na rua e vê pornografia espalhadas por toda cidade através das propagandas em outdoor. Nas bancas de jornal, as revistas eróticas ficam expostas para quem quiser ver, isso era impossível de se ver na Ditadura, havia um controle maior nesse sentido”, conta Valle.


Ainda de acordo com ele os veículos sofriam uma censura e isso colaborava para uma maior qualidade do material exibido. “Hoje o que a gente ver é um desrespeito à moral familiar através das novelas e programas que incentivam práticas que vão contra a bíblia. As pessoas criticam o governo por qualquer motivo, naquela época isso era impensável, as pessoas respeitavam as autoridades,” acrescenta.


Na igreja, Cleverson afirma que ninguém podia falar mal das autoridades. “ Eu era pequeno e meu pai dizia que as autoridades eram constituídas por Deus e portanto deveriam ser respeitadas, essa era a orientação passada pelas lideranças da igreja”.


Na igreja O Brasil para Cristo, no centro de São Paulo, a situação não era diferente, o diácono aposentado Izaias Bezzera de Matos, lembra que eles viviam como se a ditadura não existisse. “Nós não tivemos problemas com os militares, as coisas aconteciam fora da igreja, sabíamos das manifestações, das prisões, mas não íamos contra os militares, porque nossa liderança dizia que deveríamos respeitar os governantes, assim nem questionávamos as atitudes deles” cita.


O diácono ainda ressalta que “nas celebrações não se comentava nada sobre as ações dos militares, eles tinham que manter a ordem e quem fosse contrário a essas ordens era reprimido e até preso. Por isso, em sinal de respeito e até de medo não falávamos nada. Naquela época a situação era muito difícil e tinham que trabalhar bastante, por isso não se preocupavam com a situação política do país, pois sua família ia de casa para o trabalho, do trabalho para casa e para a igreja”.


Esse respeito também era presente nas dependências das igrejas adventistas. Jorge Lucien Burlany, era pastor em São Paulo e explicou que embora muitos discordassem das atitudes dos militares, não se via qualquer tipo de rebeldia entre os membros da igreja. “Muitos dos nossos irmãos em Cristo não concordavam com o modelo de governar dos militares, só que permaneciam quietos e neutros”, relata.


Burlany acrescentou ainda que os líderes da igreja usavam argumentos bíblicos para convencer os membros a não se manifestarem contra os governantes. “Como cristãos nós éramos instruídos através das escrituras sagradas a aceitarem as ordens dos militares, não éramos contra nem a favor”.


O pastor pensava muito antes de fazer uma pregação. “Eu como qualquer outro cidadão tinha medo, os militares eram muitos truculentos e muitas vezes antes de subir ao púlpito, eu relia o meu sermão para não falar algo errado, era uma liberdade vigiada”, finaliza Burlany.


Indagados se prefiram o militarismo ou a democracia, os religiosos foram enfáticos. “ Apesar de ser uma época onde os princípios eram respeitados, eu prefiro a democracia porque nós temos a liberdade de colocar quem a gente acha que é melhor, naquela tempo não”, fala Cleverson.

“ A liberdade era vigiada, não sofríamos torturas físicas, mas a pressão psicológica é muito pior pensar duas vezes antes de falar alguma coisa, lógico que não vamos sair por ai criticando todo mundo, mas podemos fazer”,opina Burlany.


“Hoje o Brasil vive um momento que pra nós era impossível de se pensar, sair as ruas para protestar contra o governo? Naquela época, isso era assinar sentença de morte”, conclui Izaias.


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