Flores em meio ao lixo
Considerada um hino contra o Golpe Militar no Brasil, “Pra não dizer que não falei das flores” era um convite ao povo para a batalha contra os ditadores
Jacqueline Gava
O Golpe militar instaurou no Brasil uma forte censura sobre qualquer manifestação que fosse contrária ao governo imposto no país, e não demorou muito para a música estar entre os principais alvos. A oposição à censura e a esperança em uma nova ordem demográfica eram expressadas em letras que, na maioria das vezes, misturavam o terror da realidade com uma beleza utópica. Segundo o governo, elas eram ofensivas às leis, à moral e aos costumes.
Lançada em 1968 pelo cantor e compositor Geraldo Vandré, a música “Pra não dizer que não falei das Flores” foi sensação do Festival de Música Brasileira exibido pela TV Record na época, alcançando a segunda colocação. Pelo fato de sua letra possuir versos de rimas fáceis logo era cantada por todos nas ruas. O refrão “Vem, vamos embora que esperar não é saber. Quem sabe faz a hora, não espera acontecer” chamava a população às ruas sem qualquer tipo de rodeio.
Considerada o hino do período ditatorial, a música não se tratava diretamente de flores, porém tentava mostrar o caminho para chegar a elas. Através dela, Vandré “convidava” o público à revolta contra o regime ditatorial e ainda fazia fortes provocações ao exército. Bastou poucos dias para ter sua execução proibida durante anos.
Na época, tudo era acompanhado muito de perto pelos censores do governo. O objetivo era passar a ideia que o país se encontrava em ordem e nada que o afetasse, mesmo que indiretamente, poderia ser levado adiante, já que os movimentos contra o poder estavam cada vez mais intensos.
Vale ressaltar que nem todas as músicas foram criadas como forma de protesto. Alguns cantores, como Caetano Veloso e Gilberto Gil, compunham músicas com forte teor político e social, mas nem sempre faziam críticas diretas à ditadura. Marco Villa, historiador e professor do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal de São Carlos, ressalta que as formas de expressão e cultura variavam de acordo com cada classe social. “Uma coisa era a música da classe média e outra a do chamado povão. Em minha opinião Odair José pode ser tão importante como Geraldo Vandré”, afirmou. Assim como a maioria dos músicos brasileiros, Odair José, compositor e intérprete de “Pare de tomar a pílula”, também sofreu ameaças e foi censurado.
Geraldo Vandré foi um dos primeiros artistas a ser perseguido e censurado pelo governo militar. Começou sua carreira compondo e cantando canções de amor e se tornou o artista mais visado pelos milicos, Entre suas canções que propagavam uma certa “mensagem subliminar” como protesto estão também “Arueira” e Disparada. Com a promulgação do Ato Institucional 5 e o acirramento da ditadura, o cantor saiu do país morou na Europa por 4 anos. Sem fazer shows desde 1968, rompeu mais de uma década de silêncio ao se apresentar no Paraguai em 1982. Mais tarde compôs “Fabiana”, em homenagem à Força Aérea Brasileira.
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