Em nome da fé
Orientada pela liderança, professora conta como lidava com a ditadura na igreja e no trabalho.
Por Wagner Luan
Apesar de ser pouco mencionada, a ditadura também esteve presente no ambiente da igreja. O ano era 1968 e as manifestações contra ditadura fervilhavam nas ruas da capital de São Paulo. Enquanto os jovens revolucionários enfrentavam os militares, as igrejas evangélicas permaneciam indiferentes.
Edna de Oliveira Bergold (71) era diretora da Associação Paulistana Adventista, órgão que cuidava da parte educacional da igreja. “Nós visitávamos as escolas em diversos municípios e a orientação que a igreja passava pra gente era que não deveríamos ir contra a ditadura, podíamos ter a nossa convicção de querer liberdade, mas nunca expressa-lá em público”, ela comenta.
A diretora conta que nas reuniões internas da igreja se falava de respeito. “A liderança ensinava que nós tínhamos que respeitar as autoridades, eles se baseavam no livro de Romanos 13: 1 e 2 que fala que devemos sujeitar as autoridades e quem se rebelar,está condenado. Com isso nós não combatíamos os militares e continuávamos a viver a nossa vida como se nada estivesse acontecendo,” expõe Edna.
Mesmo se tratando de jovens religiosos, os militares sempre permaneciam alerta e ligados, qualquer aglomeração era motivo para eles enquadrarem. “Eu me lembro de um sábado a noite, naquela época não tinha shopping então, os jovens da igreja se reuniam para conversar, e em uma dessas reuniões, alguns policiais viram a movimentação e vieram pra cima da gente pra saber o que estávamos fazendo”, lembra a aposentada.
“ Passamos um apuro danado aquela noite, pois não sabíamos o que fazer, eles revistaram todo mundo e como não acharam nada pediram para que nós nos retirássemos, tivemos que ir embora”, completa.
Outro episódio que marcou Edna durante a ditadura foi em uma de suas viagens pelo interior do estado. “ Eu viajava bastante juntamente com aminha equipe e em uma dessas viagens, o repórter de uma rádio da cidade de Itarará(SP) veio perguntar sobre o nosso trabalho e durante a entrevista ele começou a nos questionar sobre a ditadura, nós não percebemos e mandamos bala, só depois que vimos a ‘burrada’ ,” conta ela arrependida.
Com medo de que as declarações causassem problemas para ela e a igreja, Edna pediu que o repórter apagasse a entrevista e o rapaz apagou.
Sobre esse período, Edna lembra que foi uma época de medo. “ A vida era levada na base do temor, tínhamos que andar pisando em ovos, eles forçavam o nosso comportamento como se aquilo fosse a coisa mais normal e em nome desse comportamento, seres humanos foram presos, torturados, mortos e desaparecidos, foi um ponto negro da história, que espero nunca mais viver”, conclui.
Edna ficou na organização por mais de 20 anos, quando resolveu morar no interior para fugir da pressão que existi na capital.