A moral da educação na ditadura
Documentos comprovam que a matéria de Educação Moral e Cívica esteve presente na Ditadura
Rafaela Martins
A partir de 1964 o Brasil enfrentou um momento marcante em sua história, a tomada do poder pelos militares transformou o modo de viver da sociedade brasileira. Diversas bases sociais foram totalmente influenciadas pelos princípios militares. Em especial a educação sofreu uma mudança que proporcionou à uma geração um ensino que hoje muitos tem saudade.
Durante a Ditadura Militar houve uma convocação em todo o país para o cumprimento de deveres cívicos e patrióticos. Como exemplo desse chamado, a população era convidada a participar de desfiles em dias cívicos, a manter fidelidade aos órgãos policiais através de denúncias de vizinhos, amigos e parentes que tivessem envolvimento com atividades “subversivas”, entre outras formas de cumprir tais deveres civis.
De acordo com um artigo publicado pela Revista HISTEDBR On-line, autoria de Vanessa Kern de Abreu e Geraldo Inácio, “a ‘Revolução pela Educação’ pode ser entendida como um redimensionamento de vários conceitos e práticas”. Criada em 1969 pelo decreto de lei 869, a Educação Moral e Cívica foi instituída como matéria obrigatória para todos as modalidades de ensino.
Artur Eduardo Pinto, representante de vendas, relembra como era jurar a bandeira e cantar o hino nacional corretamente aos 9 anos de idade. Aluno de uma escola pública no interior de São Paulo, a Educação Moral e Cívica fez parte das aulas dadas em sala. “Ali aprendemos diversas coisas sobre como cuidar, servir e amar o país e nossa pátria. Cantar o hino nacional e jurar a bandeira eram requisitos básicos em minha escola. Por não ter contato direto com essa fase, as matérias só contribuíram em minha formação e aprimoramento educacional e moral”, conta Artur.
Para o historiador e sociólogo Elder Hosokawa muitas destas disciplinas e ensinamentos morais se devem à simples falta de professores existente neste período. Por esse motivo a maioria dos professores que assumiram eram profissionais com alto índice moral e que foram inseridos nas escolas.
“Como não havia professores e nem interesse por parte destes em se dedicar a tais matérias, essas disciplinas foram lecionadas por profissionais de História e Geografia, pastores, padres, advogados, políticos e etc. Contanto que fosse dada por gente de confiança da escola, da diretoria, da autoridade local quem em sua quase totalidade era favorável ao sistema político vigente”, explica Hosokawa.
Na época, o professor João de Oliveira lembra como as universidades e escolas básicas começaram a direcionar o ensino focando em um campo moral. “Meus filhos e alunos passaram a ter matérias que de uma forma incentivavam a educação e moral, coisa que sempre prezei, mas acabava por iludir as crianças e condicionar a acreditar que tudo era bom”.
Com o objetivo de atender as novas demandas educacionais emergentes, no contexto do Regime Militar autoritário, as reformas educacionais foram direcionadas para atingir as necessidades de centralizar e controlar tanto os professores quanto os estudantes.
Concordando com a narrativa, Oliveira conclui que “a educação evoluiu e muito com essas matérias. Hoje como um senhor na sociedade vejo o quanto os jovens atuais não tem respeito para com a sociedade. Só acho que de certa forma a educação da época desejava controlar tanto os professores quanto os alunos. A criticidade foi tirada”.
Visualizando que qualquer país precisa atualizar e adequar sua rede de Educação Básica e Superior aos novos contextos tecnológicos, políticos, econômicos e culturais, é possível entender que as reformas tiveram aspectos de modernização em relação ao que era praticado em 1960.
“A esquerda critica como sendo um reforma muito influenciada pelos interesses culturais e educacionais do governo dos Estados Unidos (MEC-USAID). Não foi de todo ruim quando percebemos grandes universidades (USP, Unicamp, Unesp) que despontaram na América Latina e chegando por muitos anos a ocupar o ranking de produção acadêmica entre as 10 melhores”, explica o sociólogo Hosokawa.
Depois de alguns anos sob constante atuação, as matérias foram se tornando flexíveis. O que antes era obrigatório, já em 1992 passou a ser opcional e logo mais, em 1993, a Educação Moral e Cívica passou a ser extinta.
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