O jeito Revolucionário de Afonso
Em pleno Governo Militar do ditador Médici, o jogador reivindicava o passe livre e a não comercialização dos jogadores como se fossem mercadorias. Como consequência da sua militância seu nome foi vetado no meio futebolístico e monitorado pelas forças de repressão
Bruna Perales
Filho de ferroviários de Marília, no interior de São Paulo, Afonso Celso Garcia Reis conviveu desde criança com causas sociais. E carregou consigo os ideais formados na infância para o resto da vida. Revelado pelo XV de Jaú em 1962, Afonsinho se destacou dentro e fora de campo pelas posições firmes e pela conquista do passe livre dos jogadores que inspiraram até música – “Meio de Campo”, de Gilberto Gil – e filme - “Passe Livre”, de Oswaldo Caldeira. Em 1965, o ex-meia foi para o Botafogo, onde ganhou os principais títulos e chamou a atenção dos militares.
Estudante de medicina na UERJ, o jogador participava de grupos de discussão e seguia sua luta para se tornar dono do próprio passe. A barba e cabelos compridos ajudavam a criar a imagem “subversiva” do meia, socialista declarado. Tudo que fazia e dizia era observado.
“A questão do passe na qual me envolvi gerou repercussões muito grandes de natureza política. Aquilo acabou tomando vultos que não interessavam ao Regime Militar. O rumo que aquilo acabou tomando foi enorme. Minhas posições tinham relação política grande”, avaliou Afonsinho.
Os problemas começaram no clube. O estilo de vida do jogador não agradava o conservador técnico Zagallo. Afonsinho treinava separado do restante do elenco. E não jogava. A saída foi ir embora. Passou por Olaria e Vasco até chegar ao Santos, em 1972, onde sentiu mais próxima a vigia dos militares.
“Em uma excursão internacional do Santos, o jornalista da delegação teve uma posição muito digna. Na volta, ele me procurou e disse que havia sido abordado por órgãos de segurança para saber se na viagem eu fazia alguma coisa, procurava uma embaixada, algo assim “, confidenciou.
Afonso não foi o único. Jogadores consagrados, como Sócrates, Casagrande e Wladimir também enfrentaram a Repressão em 1981, quando estes iniciaram a chamada Democracia Corintiana, onde jogadores, comissão técnica e diretoria decidiam tudo no clube por meio do voto. Sócrates era atuante no Movimento a favor das eleições diretas, além de ser esquerdista. Com tal atuação, os atletas eram observados pelo Regime Militar e tinham fichas no Dops (Departamento de Ordem política e social). Nos arquivos relacionados ao “Doutor”, aparecem registros de jornais que citam a participação do ex-jogador em alguns eventos, incluindo uma sessão do Movimento Pacifista Brasileiro.
Em campo, o Brasil formou um de seus maiores times da história, e o grandioso triunfo na Copa do Mundo foi perfeito para o governo, mas não para estes homens.